Redação TN Petróleo/Assessoria
A recente realização do 1º Workshop Internacional sobre Contingência e Resposta a Emergências, com foco na detecção de chamas em tanques de armazenamento, lança luz sobre um tema de criticidade máxima para a indústria de petróleo e gás. Em um setor onde os riscos operacionais são inerentes e as consequências de um incidente podem ser devastadoras, a capacidade de prever, preparar e responder a emergências é um pilar de sustentabilidade e resiliência. Tradicionalmente vista como uma função de suporte, a área de suprimentos emerge, neste novo paradigma, como um parceiro estratégico indispensável, atuando em simbiose com a engenharia e os especialistas técnicos para construir as bases da excelência em contingência.
Este artigo explora, com base em regulamentações, casos recentes e melhores práticas de mercado, como a cadeia de suprimentos transcendeu seu papel transacional para se tornar uma peça-chave na arquitetura de um sistema de resposta a emergências robusto, ágil e eficaz.
A Estrutura Regulatória e o Papel de Suprimentos
A preparação para emergências no Brasil é regida por uma estrutura robusta, notadamente o Plano Nacional de Contingência (PNC), instituído pelo Decreto n.º 10.950/2022, e os Planos de Emergência Individuais (PEI), exigidos pela Resolução CONAMA 398/2008. Ambos os documentos são explícitos ao demandar que as operadoras garantam a disponibilidade imediata de recursos próprios, humanos e materiais, para as ações de resposta [1, 2].
Essa exigência posiciona a área de suprimentos no epicentro da preparação. A responsabilidade por adquirir, gerenciar e garantir a prontidão de equipamentos críticos desde os kits SOPEP (Shipboard Oil Pollution Emergency Plan), em conformidade com a convenção MARPOL 73/78, até Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) e barreiras de contenção recai diretamente sobre a cadeia de suprimentos. É uma função que vai além da simples compra, exigindo uma gestão de inventário estratégica e um profundo conhecimento das normas técnicas e regulatórias.
A Vanguarda da Preparação: Tecnologia e Gestão de Riscos
A eficácia de uma resposta a emergências começa muito antes do incidente. Começa com a seleção e aquisição das tecnologias certas e uma gestão de riscos proativa, áreas onde a colaboração entre engenharia e suprimentos é fundamental.
Aquisição de Tecnologias de Detecção de Chamas
A detecção precoce de chamas em tanques de armazenamento é uma das principais barreiras de segurança para evitar catástrofes. A engenharia define os requisitos técnicos baseados em análises de risco, mas é a área de suprimentos que viabiliza a implementação dessas soluções, navegando em um mercado de fornecedores globais e tecnologias complexas. A tabela abaixo, baseada em soluções de ponta como as da Emerson [3], ilustra a complexidade e as implicações para a cadeia de suprimentos:

Mitigando Riscos com um PMO de Procurement
Grandes projetos de capital, como a construção ou modernização de parques de tanques, carregam riscos inerentes que podem comprometer a prontidão para emergências. Atrasos na entrega de equipamentos de segurança, sobrecustos que limitam a aquisição de tecnologias adequadas e problemas de qualidade são ameaças reais. Para mitigar esses riscos, a implementação de um Procurement Program Management Office (PMO) é uma estratégia eficaz [4].
Um PMO atua como uma torre de controle, centralizando a governança, o rastreamento de conformidade, a coordenação com fornecedores e a gestão de custos e cronogramas. Ao garantir que os equipamentos de detecção e resposta a emergências sejam entregues no prazo, dentro do orçamento e conforme as especificações técnicas, o PMO de suprimentos assegura que a base da pirâmide de segurança seja sólida.
Suprimentos em Ação: A Logística como Espinha Dorsal da Resposta
Quando um incidente ocorre, a cadeia de suprimentos se transforma na espinha dorsal logística da operação de resposta. O conceito de "Caixa de Ferramentas", apresentado pela Petrobras em seu workshop de 2022, ilustra bem essa função: ter os recursos certos, organizados e prontos para uso imediato [5].
O treinamento de logística para crises, como o conduzido pela OSRL (Oil Spill Response Limited), demonstra a necessidade de uma seção de logística dedicada dentro da estrutura de comando de incidentes [6]. Essa equipe é responsável por:
• Mobilização Rápida: Deslocamento de pessoal, equipamentos e materiais para o local do incidente.
• Gestão de Áreas de Preparação (Staging Areas): Organização de bases avançadas para distribuição de recursos.
• Coordenação com Parceiros: Integração com fornecedores, agências governamentais e outras instituições.
Dois casos recentes ilustram a magnitude desse desafio logístico:
1 Incêndio na Refinaria da Chevron (Outubro de 2024): Um incêndio em uma instalação com 150 grandes tanques e capacidade de 12,5 milhões de barris exige uma resposta massiva e coordenada. A disponibilidade imediata de agentes extintores, equipamentos de combate a incêndio e pessoal especializado depende diretamente da eficácia da cadeia de suprimentos e dos planos de aquisição pré-estabelecidos [7].
2 Manchas de Óleo no Nordeste (2019): A resposta a este desastre de vasta extensão geográfica exigiu um esforço logístico monumental, com a Petrobras mobilizando cerca de 500 profissionais por dia e disponibilizando 4.000 metros de barreiras de contenção. A gestão de tal operação, incluindo o descarte de resíduos, é um feito da cadeia de suprimentos [5].
A Aliança Estratégica: Engenharia e Suprimentos na Construção da Excelência Técnica
A mensagem central é clara: a excelência técnica em contingência e resposta a emergências não é responsabilidade exclusiva da engenharia. É o resultado de uma aliança estratégica com a área de suprimentos.
A engenharia, com seu conhecimento técnico, realiza os estudos de dispersão, analisa os cenários de risco e define o que é necessário para garantir a segurança. A área de suprimentos, com sua expertise de mercado, gestão de fornecedores e processos de aquisição, define como obter essas soluções de forma eficiente, segura e em conformidade com as mais altas certificações internacionais.
Workshops como o promovido pela Petrobras, que reúnem engenheiros, consultores de contingência, gestores ambientais e outros stakeholders, são o fórum ideal para solidificar essa parceria. É nesses eventos que a engenharia apresenta um estudo de modelagem que prevê um tempo de toque de óleo de 118 horas, e a área de suprimentos traduz essa informação em um plano de mobilização de recursos que deve ser executado dentro dessa janela crítica [5].
Suprimentos agrega valor ao processo ao:
• Qualificar Fornecedores: Garantir que os fabricantes de tecnologias críticas possuam as certificações e o histórico necessários.
• Gerenciar Contratos Complexos: Incluir cláusulas de manutenção, treinamento e suporte técnico.
• Assegurar a Prontidão: Participar de exercícios e simulações para testar a agilidade da cadeia de suprimentos.
Conclusão
A gestão de contingência e resposta a emergências na indústria de petróleo e gás evoluiu. Ela deixou de ser uma preocupação isolada de segurança operacional para se tornar uma disciplina integrada que depende de uma complexa rede de competências. Neste cenário, a área de suprimentos abandonou a posição de um executor de ordens para assumir um assento na mesa estratégica.
A sinergia entre a precisão técnica da engenharia e a inteligência de mercado da cadeia de suprimentos é a verdadeira base da excelência. Ao trabalharem juntas na preparação, na resposta e na melhoria contínua, essas duas áreas garantem que a indústria não apenas responda a emergências, mas que esteja fundamentalmente preparada para elas, protegendo vidas, o meio ambiente e o futuro do setor.
Referências
[1] IBAMA. (2022). Plano Nacional de Contingência para Incidentes de Poluição por Óleo em Águas sob Jurisdição Nacional (PNC). Disponível em: https://www.gov.br/ibama/pt-br/assuntos/fiscalizacao-e-protecao-ambiental/emergencias-ambientais/petroleo-e-derivados/pnc
[2] Petrobras. (s.d.). Plano de Emergência Individual (PEI). Comunica Bacia de Santos. Disponível em: https://comunicabaciadesantos.petrobras.com.br/plano-de-emergencia-individual-pei-
[3] Emerson. (s.d.). Detecção de gás e chamas em parques de estocagem de tanques. Disponível em: https://www.emerson.com/pt-br/automation/measurement-instrumentation/common-applications/gas-flame-detection-of-tank-farms
[4] GEP. (2023). Managing Risks in In-House Procurement for Oil & Gas Capex Projects. GEP Blog. Disponível em: https://www.gep.com/blog/strategy/in-house-procurement-oil-and-gas-capex-projects-managing-risks
[5] Petrobras. (2022). Workshop apresenta ações de atendimento à emergência de vazamento de óleo. Comunica Bacia de Santos. Disponível em: https://comunicabaciadesantos.petrobras.com.br/w/workshop-apresenta-acoes-de-atendimento-a-emergencia-de-vazamento-de-oleo
[6] OSRL. (2024). Crisis-Ready Excellence: Delivering preparedness training to a major international oil and gas company. OSRL Knowledge Hub. Disponível em: https://www.osrl.com/knowledge-hub/resource-library/incident-management/crisis-ready-logistics-training-oil-gas/
[7] Portal Qualidade Petróleo. (2025). EUA: Incêndio de grandes proporções atinge refinaria próxima a Los Angeles. Disponível em: https://portal.qualidadepetroleo.com/eua-incendio-de-grandes-proporcoes-atinge-refinaria-proxima-a-los-angeles/
Sobre o autor: Alexandre do Valle é PhD na área de engenharia de suprimentos com foco em projetos digitais pela Universidade Federal Fluminense. Mestrado em tecnologia de Blockchain com foco em ferramentas e processos de digitalização para a cadeia de suprimentos. Pós-graduação em Gestão de Projetos pela Universidade Federal Fluminense e MBA em Projetos de Energia e ESG pela COPPE, Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Consultor sênior para a empresa 2BSUPPLY. Psicanalista e Coach Profissional com certificação pelo IGT, International Coach Federation e ICF Brasil, tendo como ênfase análise comportamental e clareza de metas nas áreas profissionais e pessoais.
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