Pesquisadores vão trabalhar com a oxi-combustão e a combustão do tipo Chemical Looping (CLC), que são pouco conhecidas no país.
Redação TN/AssessoriaDuas tecnologias pouco conhecidas no Brasil capazes de gerar energia, capturar e purificar o dióxido de carbono (CO2), um dos grandes vilões do aquecimento global, estão sendo investigadas por pesquisadores do Centro de Pesquisa para Inovação em Gases de Efeito Estufa (RCGI), sediado na Universidade de São Paulo (USP) e patrocinado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) em parceria com a Shell.
“Ambas tecnologias utilizam o processo de combustão e conseguem gerar um CO2 praticamente puro, sem necessitar de nenhum processo de separação posterior, como membranas. Ou seja, o CO2 sai pronto para ser estocado ou reutilizado”, informa Guenther Carlos Krieger Filho, professor do departamento de Engenharia Mecânica da Escola Politécnica (Poli) da USP e coordenador do projeto Combustão do tipo Chemical Looping Combustion (CLC) e Oxi-combustão com GN e Biogás.
O projeto vai atuar em duas frentes. Em uma delas, os pesquisadores querem reduzir as emissões de CO2 em usinas, como termoelétricas, movidas a gás natural ou biogás por meio da oxi-combustão. “Em geral, a combustão convencional é feita com ar e em seus gases de exaustão, que são os resíduos da queima, são encontrados não apenas CO2, como também nitrogênio (N2) e outros poluentes. No caso da oxi-combustão a queima é feita com oxigênio (O2) puro no lugar do ar, o que resulta apenas em CO2 e vapor d´água”, explica Krieger Filho.
Segundo o pesquisador, essa é uma das grandes vantagens da oxi-combustão. “Na combustão convencional, mais de 70% do gás resultante do processo são compostos por nitrogênio. Entretanto, é muito caro comprimir todo esse gás para armazená-lo. Sem contar que o que interessa é obter o CO2 para ser armazenado ou ganhar outro fim. Com a tecnologia oxi-combustão é fácil separar o CO2, porque basta condensar a água e pronto”.
O foco do projeto será desenvolver câmaras de combustão capazes de executar essa operação. “A oxi-combustão demanda temperaturas muito elevadas e o reator precisa suportar esse estresse térmico. Garantir estabilidade a esse tipo de combustão é o nosso desafio”, relata Krieger Filho. Os experimentos acontecem tanto por meio de modelagem quanto de forma empírica em escala laboratorial. Nesse último caso, os pesquisadores vão desenvolver uma câmara de oxi-combustão acoplada a uma miniturbina a gás, que irá gerar o CO2 já separado do vapor d´água.
Já na parte computacional, a equipe do projeto irá a princípio utilizar alguns estudos realizados pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT), nos Estados Unidos. “É o pontapé inicial. Vamos replicar no computador a câmara de combustão desenvolvida pelo MIT e a partir daí fazer nossos próprios estudos com técnica ótica-laser para medir campos de velocidade e identificar a estrutura da chama, por exemplo”, prossegue Krieger Filho. “Vamos usar esses dados para melhorar e modificar os modelos computacionais que futuramente vão permitir a construção de uma câmara de combustão em escala industrial”.
Retrofitting nas usinas – Para adotar a oxi-combustão, a usina precisa fazer um retrofitting. “É uma tecnologia que pode ser incorporada à estrutura já existente. Entretanto, ela exige a implantação de uma planta criogênica para produzir O2 puro”, conta Krieger Filho. “No projeto pretendemos, inclusive, testar qual seria a concentração tolerável de nitrogênio nesse processo para tentar diminuir os custos da planta”.
De acordo com o especialista, a equipe de pesquisadores do RCGI não localizou estudos relativos ao uso de oxi-combustão com biogás. “Ao que tudo indica, nosso projeto é pioneiro nessa questão. Em função da necessidade de reduzir as emissões de gases de efeito estufa, a produção de biogás deve crescer no Brasil, pois aproveita os dejetos do agronegócio. Se a usina utilizar biogás e oxi-combustão, poderá ficar negativa em termos de emissão de CO2”, afirma Krieger Filho.
A outra tecnologia que será estudada pelos pesquisadores do projeto é a Combustão Química Cíclica, ou CLC, na sigla em inglês. “Nesse processo temos dois reatores que ficam interconectados. Em um deles, com ar, acontece a oxidação de uma partícula metálica, que é então enviada para o outro reator e cede O2 para a queima do combustível”, explica Fernando Luiz Sacomano Filho, professor do departamento de Engenharia Mecânica da Poli-USP e vice coordenador do projeto. “Quando os gases de exaustão resfriam, a água se condensa e obtém-se assim o CO2 puro”.
Nesse caso, a usina não precisa instalar uma planta criogênica, pois o O2 é gerado pelo próprio processo de combustão. “Entretanto, a CLC não se adequa ao retrofitting e quem quiser adotá-la precisa modificar a planta industrial”, prossegue o especialista que conheceu a tecnologia durante o doutorado na Universidade Técnica de Darmstadt, na Alemanha, concluído em 2017.
A exemplo do que vai acontecer na parte do projeto voltada à oxi-combustão, o objetivo dos pesquisadores é construir reatores por meio de modelagem e de forma empírica em laboratório. No quesito computacional será utilizado como ponto de partida uma planta piloto situada na Universidade Técnica de Darmstadt, que vai ser então trabalhada pela equipe do RCGI. “Embora tenha surgido na década de 1950, essa tecnologia ganhou força nos últimos 20 anos como alternativa para captura de CO2. Com esse fim, trata-se de uma tecnologia em desenvolvimento no mundo, onde a comercialização ainda se encontra numa fase embrionária”, diz Sacomano Filho.
No projeto os pesquisadores pretendem testar tipos de minérios que podem ser utilizados nos reatores, como é o caso da ilmenita (FeTiO3). “São várias possibilidades. No mundo existem estudos sobre transformar resíduos da indústria eletrônica em partículas metálicas dos reatores da CLC, mas esse não é nosso objetivo imediato”, relata.
De acordo com o pesquisador, o Brasil tem grande potencial energético renovável se levarmos em conta as hidrelétricas. “Mas quando consideramos a energia primária, que alimenta a indústria, somos muito dependentes de combustível fóssil”, afirma Sacomano Filho. Segundo ele, uma das metas durante o projeto é testar a CLC movida a gás natural, biogás e biomassa. “Será uma novidade”, conclui.
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