<P>Sucesso mesmo, só na construção de barcos de apoio à indústria petrolífera offshore, segmento de embarcações sofisticadas e caras, mas com baixo conteúdo nacional, e na montagem de plataformas para a mesma indústria. Mas na produção de navios de grande porte, ramo no qual o governo ap...
Valor EconômicoSucesso mesmo, só na construção de barcos de apoio à indústria petrolífera offshore, segmento de embarcações sofisticadas e caras, mas com baixo conteúdo nacional, e na montagem de plataformas para a mesma indústria. Mas na produção de navios de grande porte, ramo no qual o governo aposta para tornar o Brasil um player global, ainda será preciso desatar uma série de nós.
A demora no início da construção dos petroleiros encomendados pela Transpetro, subsidiária de logística da Petrobras, faz as incertezas do setor aumentarem. A Andrade Gutierrez acaba de abandonar a parceria que tinha com Camargo Corrêa, Queiroz Galvão e Promar para construir em Suape (PE) o estaleiro Atlântico Sul, que deverá construir os maiores navios da encomenda da estatal: dez embarcações tipo Suezmax.
O presidente da Construtora Andrade Gutierrez, Rogério Nora de Sá, disse que o grupo saiu do projeto porque, depois da proposta entregue, ocorreram negociações com a Transpetro que levaram a um nível de risco empresarial além da capacidade que a construtora avaliava ser adequado suportar. A questão foi em torno dos preços que foram apresentados. As novas negociações foram para reduzir valores. Chegaram a um ponto que achamos que o risco (do investimento) era grande em relação aos recursos necessários, mesmo com financiamento, para colocar o projeto em pé. O risco era acima do adequado, disse.
Em termos setoriais, o problema é que a Transpetro não deverá assinar, antes das eleições de outubro, os contratos com os estaleiros que venceram a licitação para construir 26 grandes petroleiros ao custo total de US$ 2,48 bilhões. Analisamos o financiamento para o projeto junto ao BNDES, mas dependemos da assinatura dos contratos, diz Waldemiro Arantes Filho, presidente do estaleiro Aker Promar, sócio do Atlântico Sul.
Sem contratos, as empresas não podem fazer investimentos para se modernizarem e nem pedir financiamentos ao BNDES, gestor do Fundo de Marinha Mercante (FMM), principal fonte de capital para o setor. O problema é que, para assinar os contratos, a Transpetro precisa aumentar sua capacidade de endividamento, o que depende do Senado. Em clima de campanha, o tema ganhou contornos políticos e dificilmente será votado antes de 1º de outubro.
Fontes do setor dizem que a estimativa inicial era de que os 26 navios, parte de um pacote total de 42, custasse cerca de US$ 1,5 bilhão. Como ficaram US$ 1 bilhão mais caros, fica evidente um dos problemas centrais do segmento: a dificuldade de competir com os principais centros mundiais da indústria naval, localizados na Ásia, como Coréia do Sul e Cingapura.
A encomenda de 26 navios é formada por 10 embarcações tipo Suezmax, 9 Aframax e Panamax, 4 de produtos (derivados claros de petróleo) e 3 gaseiros (GLP). No pico do mercado internacional, já revertido, o preço do Panamax chegou a cerca de US$ 70 milhões. A Transpetro pagará entre US$ 89,4 milhões (o primeiro navio) e US$ 85,6 milhões (o último). Fontes do setor avaliam que, mesmo a Transpetro tendo conseguido descontos em relação às propostas iniciais, a estatal fechou com preços referenciados em um auge do mercado que já ficou para trás.
Os especialistas apostam na evolução progressiva da indústria. Os preços do setor, que estava praticamente parado, não serão idênticos aos dos estaleiros asiáticos, mas com a retomada eles tendem a cair muito, disse o almirante Armando Senna Bittencourt, presidente da Sociedade Brasileira de Engenharia Naval (Sobena). Bittencourt diz que a escala de produção garantirá competitividade.
Carlos Gomes, diretor do Estaleiro Sermetal, entende que o recomeço é o mais difícil. O estaleiro conta com o maior dique seco (instalação para construir navios) da América Latina, mas há dez anos vem fazendo apenas reparos navais. Gomes avalia que, assinados os contratos com a Transpetro, o Sermetal vai precisar de cinco anos para estar azeitado e competir por uma fatia do mercado externo.
A seu favor o Brasil tem a engenharia qualificada e a mão-de-obra barata. O fundamental para ser competitivo é ter preço, prazo e qualidade no projeto total, diz Carlos Filipe Rizzo, presidente da francesa Doris Engineering, especializada em soluções tecnológicas para offshore. O presidente da Sobena destaca a excelência das escolas de engenharia naval do país, algo reconhecido no meio técnico.
À frente, a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e a Universidade de São Paulo (USP). O engenheiro Segen Stefen, diretor da escola de pós-graduação da UFRJ (Coppe-UFRJ), disse que a agregação de tecnologia é essencial para dar sustentação a qualquer retomada do setor naval. Enquanto as encomendas não vêm, as escolas buscam apoio da própria Transpetro para desenvolver capacitação.
Stefen disse que a demanda pelos cursos de engenharia naval começa a crescer. Por enquanto, mais focada no segmento offshore, justamente o que apresenta progressos consideráveis. Desde o primeiro programa de encomendas da Petrobras de navios de apoio às atividades de exploração e produção de petróleo e gás, em 1999, foram construídos no país mais de 40 embarcações do gênero, estima Ronaldo Lima, presidente da Associação Brasileira das Empresas de Apoio Marítimo (Abeam).
A entidade considera que há espaço para a Petrobras contratar a construção de 12 PSVs (Platform Supply Vessel) e, em uma segunda etapa, mais 20 AHTS (Anchor Handling Tug Supply). Lima diz que os PSVs têm, em média, índices de nacionalização entre 45% e 50%. Nos navios tipo AHTS, o percentual é menor, de 40% a 45%. Estudos vêm sendo feitos no para tentar aumentar estes índices. Os AHTS são equipados com guinchos e atuam como rebocadores e no reposicionamento de âncoras das plataformas. Estas embarcações custam o dobro de um PSV, usado para transporte nas atividades offshore.
No segmento de plataformas, a construção no país inclui um maior conteúdo nacional. A P-51, que está sendo construída no estaleiro Keppel Fels, em Angra dos Reis (RJ), deve ser entregue em 2007 com um índice de nacionalização de cerca de 70% do valor total da obra. A P-52, encomendada ao mesmo estaleiro e com previsão de entrega no fim deste ano, deverá ter um índice semelhante. No caso da P-51, incentivos fiscais dados pelo governo do Rio foram deterdeterminantes para que a Petrobras aceitasse construir o casco da plataforma no Brasil. O casco da P-52 foi construído em Cingapura.
Fonte: Valor Econômico (Francisco Góes, Chico Santos e Heloisa Magalhães)
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