Agência FAPESP
A otimização dos motores flex-fuel tornou-se um urgente desafio tecnológico no momento em que o etanol veicular se afirma, cada vez mais, como alternativa para a redução das emissões de CO2 e outros poluentes. No Brasil, quase 90% dos veículos leves licenciados em 2014 já dispunham da tecnologia flex-fuel. E, embora de forma menos vigorosa, a transição dos combustíveis fósseis para os biocombustíveis está em curso em muitos outros países, principalmente por meio do aumento do percentual de etanol acrescentado à gasolina.
Nesse contexto, os trabalhos apresentados por pesquisadores brasileiros no Leeds-Lyon Symposium on Tribology (LLST) de 2015 mostraram o quanto o país avançou no estudo dos impactos causados nos motores pelos biocombustíveis. “O Laboratório de Fenômenos de Superfície (LFS) da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP) é, atualmente, um dos centros de investigação líderes no setor”, disse Tiago Cousseau, um dos pesquisadores do LFS presentes no LLST à Agência FAPESP.
Além de três trabalhos do LFS (um deles em parceria com a Universidade de Halmstad, na Suécia), dois trabalhos da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRGN) foram levados ao encontro, que é considerado um dos congressos mais tradicionais e respeitados na área. A edição de 2015 do Leeds-Lyon reuniu mais de 300 pesquisadores de vários países.
As pesquisas do LFS são apoiadas pela FAPESP por meio do projeto “Desafios tribológicos em motores flex-fuel”, integrado aos programas Pesquisa em Bioenergia (BIOEN) e Pesquisa em Parceria para Inovação Tecnológica (PITE). As instituições parceiras no projeto são a Petrobras, as montadoras de veículos Fiat, Renault e Volkswagen, as empresas de autopeças Mahle e Tupy, a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e a Universidade Federal do ABC (UFABC), além da própria USP.
“O foco do LFS tem sido essencialmente reduzir a perda de eficiência dos motores causada pelo atrito e o desgaste dos componentes. Isso tem a ver com a geometria das peças e também com sua microgeometria, definida pela operação de usinagem chamada brunimento”, afirmou o engenheiro Amilton Sinatora, professor titular da Escola Politécnica da USP e coordenador do projeto.
Não se trata do simples polimento, porque, em certas regiões ao longo do curso do pistão, o polimento excessivo pode prejudicar a ação dos aditivos dos lubrificantes. O que os pesquisadores do LFS fazem é controlar o processo de usinagem, observando a topografia da peça na escala de tamanho de dois décimos de mícron. “Para cada região, há uma rugosidade, um acabamento adequado. O polimento não deve ser homogêneo nem do ponto de vista espacial nem do ponto de vista temporal. No início da vida útil do motor, é necessário que haja maior rugosidade. No decurso do funcionamento, a rugosidade diminui naturalmente e sua importância também diminui”, informou Sinatora.
Devido à necessidade de reduzir o consumo de energia, existe uma tendência mundial, inexorável, de produzir lubrificantes cada vez menos viscosos. Com menor viscosidade, o motor roda mais consumindo menos combustível. “Mas é preciso determinar os aditivos apropriados para essa nova geração de lubrificantes. E este é outro subtema que estudamos”, prosseguiu Sinatora.
Além disso, no caso dos motores flex-fuel, existe uma peculiaridade a ser considerada. Trata-se da água presente no etanol, em um percentual de 5%. Essa água, juntamente com o próprio etanol, “lava” as superfícies dos componentes, carregando os aditivos depositados pelos lubrificantes. “A película de aditivos, que chamamos de ‘tribofilme’, é removida pelo etanol ou mesmo pela gasolina consumida no Brasil, que, de acordo com a legislação, pode conter até 27% de etanol. Trabalhando com a geometria e microgeometria dos componentes e com a formulação de lubrificantes, procuramos, por várias vias, minimizar os inconvenientes e melhorar o desempenho dos motores”, acrescentou Cousseau.
Por ser desenvolvido em parceria com montadoras concorrentes, não cabe ao projeto “Desafios tribológicos em motores flex-fuel” produzir tecnologia aplicável (know how). Suas pesquisas se voltam para o conhecimento dos fundamentos (know why), que cada empresa parceira poderá depois utilizar no desenvolvimento de seus próprios processos e produtos.
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