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Descomissionamento e Repetro-Sped, por Julia Mota

Julia Mota
05/09/2019 13:43
Descomissionamento e Repetro-Sped, por Julia Mota Imagem: Divulgação Visualizações: 1680 (0) (0) (0) (0)

O descomissionamento de instalações é hoje um enorme desafio para a indústria de petróleo e gás natural no Brasil. O início da produção ocorreu na década de 1940 em campos terrestres e no final da década de 1960 para os marítimos, e os campos que começaram a ser explorada em 1998 (bid “0”) possuem plataformas operando há mais de 25 anos, já em fase final de vida útil.

Além do desafio de mensurar o passivo ao longo do projeto, uma série de fatores precisam ser considerados, e principalmente a adequação da regulamentação e a capacitação técnica para apresentação de soluções próprias para o descomissionamento.

O órgão regulador - a ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis) tem a tarefa complexa de elaborar normas que possam nortear as atividades de descomissionamento, minimizando os riscos às pessoas e ao meio ambiente. Os operadores devem assumir a responsabilidade por recuperar áreas afetadas, com passivos ambientais.

A Petrobras vem priorizando a produção no pre-sal, que cresceu virtiginosamente nos últimos anos (729% entre 2012 e 2018), enquanto o pos-sal sofreu queda (41% entre 2012 e 2018). Neste contexto, alguns programas de descomissionamento já foram aprovados, como Roncador e Marlim Sul, e diversos outros estão em análise.

As oportunidades de descomissionamento vão movimentar o mercado e gerar demanda de diversos serviços e equipamentos, durante muitos e muitos anos no Brasil. São diversos os serviços relacionados: projetos de engenharia, inspeção submarina, gerenciamento de resíduos, monitoramento ambiental, dentre outros. Quanto aos equipamentos, são necessários sondas, HLSVs, PSVs, rebocadores, balsas e outros itens especializados. Estima-se em R$ 50 bilhões os investimentos entre 2020-2040, no offshore, considerando-se 100 plataformas e 1.000 Poços offshore (fonte: ANP).

A Resolução ANP n° 27/2006, ora em revisão pela ANP, com a participação do IBAMA, da Marinha do Brasil e do IBP (Instituto Brasileiro do Petróleo), definirá os procedimentos a serem adotados para a desativação de instalações, devolução de áreas, alienação e reversão de bens e o conteúdo do programa e do relatório final de desativação de instalações. O objetivo na nova resolução é maximizar a recuperação dos reservatórios e evitar descomissionamento prematuro, fomentar negócios entre futuro e atual operador, desenvolver novos mercados e conferir previsibilidade e simplificação regulatória.

A Petrobras iniciou licitações para descomissionamento, e atualmente tem oito projetos (10 plataformas) a serem executados nos próximos anos. O projeto de Cação está em execução e tem contribuído com diversas lições aprendidas para projetos futuros. Desde 2015 foi feito o descomissionamento dos 13 poços (sonda P-59), a desativação permanente dos dutos de transferência e a desmontagem dos conveses de PCA-1, PCA-2 e PCA-3. Seu escopo remanescente será realizado por um contrato do tipo EPRD (Engenharia, Preparação, Remoção e Disposição), em 2020 (fonte: Petrobras).

Repetro-Sped

O Repetro sofreu significativas mudanças com a implementação da Medida Provisória nº 795, de 17 de agosto de 2017. Tais mudanças demandaram a edição de uma nova Instrução Normativa e o novo Repetro passa a ser denominado Repetro-Sped. Com a nova legislação, o Repetro (regime anterior) permanecerá vigente até 31/12/2020.

As principais modificações são: a inclusão de uma nova modalidade de aplicação do regime, que é a importação de bens para permanência definitiva no País com suspensão do pagamento dos tributos federais incidentes na importação; a adoção do Sped para controle contábil em substituição ao atual sistema informatizado usado para controlar o Repetro e o Repetro-Sped passa a contemplar o controle das admissões temporárias para utilização econômica com pagamento proporcional.

A Petrobras já trouxe seis plataformas novas (FPSOs) em Repetro-Sped (adquiridas) e possui 34 próprias em operação admitidas em Repetro e que portanto até dez 2020 deverão ser nacionalizadas. Possui mais de 300 subseas novos e 2.800 em operação a serem nacionalizados, além de 1.200 bens acessórios (fonte: Petrobras).

Uma das vantagens do novo sistema é que na migração para o Repetro-Sped, os bens acessórios podem ser migrados junto com a plataforma, o que facilita bastante os processos. A Petrobras tem 57 campos offshore com material em Repetro.

Descomissionamento

A Petrobras atualmente tem oito projetos offshore de descomissionamento em andamento. Inclusive, três plataformas na bacia de campos já foram desconectadas. Como são sistemas muito antigos (dos anos 80), ela enfrenta uma enorme dificuldade em encontrar documentação e informações para embasar a migração de regimes.

O desafio é ainda maior quando a plataforma é operada por terceiros. Nesse caso, o descomissionamento é conduzido conjuntamente pelo operador da embarcação, o prestador de serviço (como a SBM, Modec e outros) e os operadores (petrolíferas). Os dois tem que fornecer documentação e informações suficientes para atingir o objetivo do descomissionamento. Em geral, equipamentos submarinos são responsabilidade do operador, e plataformas e equipamentos acessórios são importadas pelo contratado.

A quantidade de bens e serviços utilizado nas operações de descomissionamento é enorme. As mesmas embarcações que fazem o descomissionamento também fazem a instalação, então o mercado é competitivo e os valores são altos.

Um outro desafio é a questão do armazenamento do material nas bases. São necessários estudos e análises relacionados ao processo de desmontagem, descarte e destruição, à luz das questões ambientais.

Na modalidade de importação definitiva Repetro-Sped, os bens devem permanecer destinados às atividades de exploração, desenvolvimento e produção das jazidas de petróleo e de gás natural pelo prazo de 5 anos. A extinção do regime Repetro-Sped ocorre de forma automática, e na hipótese de regular destinação do bem, após o decurso do prazo de 5 anos contados do registro da DI. Caso a inutilização do bem se verifique antes dos 5 anos, o beneficiário pode alocar o equipamento em outro campo, alienar para outra pessoa jurídica habilitada no regime ou permanecer instalado ou disponibilizado em seu local original de emprego.

Considera-se destinação de bens submarinos (“subsea”) nos casos em que sejam afixados ao subsolo marinho; e embarcaçoes e plataformas nos casos em que ainda estiverem disponibilizados nos locais indicados nos contratos de concessão autorização, cessão ou de partilha de produção.

Desde que a nova legislação foi publicada, houve um diálogo profícuo do mercado com a Receita Federal, que tem se mostrado muito receptiva aos pleitos dos operadores, no sentido de corrigir falhas e lacunas da lei.

A análise de toda a legislação aplicavel ao regime é uma tarefa hercúlea: são leis, decretos-leis, regulamentos, portarias, instruções normativas, constantemente revogados e modificados, o que não facilita a sua absorção. Um bom auxílio é prestado pelo “Manual do Repetro-Sped”, que resume de forma sistemática a legislação; e as “Perguntas e Respostas”, que são um canal direto de comunicação da Receita com os contribuintes. Obviamente, que para maior segurança jurídica, é necessário que as respostas sejam transcritas em normativos.

Nota-se que ainda existem questões sem solução. Por exemplo, a regra dos cinco anos aplica-se a todos equipamentos, inclusive antigos, e não somente aos equipamentos importados a partir de 1º de janeiro de 2018 no Repetro-Sped. Dentre as hipoteses permitidas de destinação do bem, antes ou depois do decurso do prazo de 5 anos, não se encontra, de forma explicita, a exportação, a alienação do bem para não beneficiario do Repetro-Sped ou a destruição. Assim, esses casos poderiam ser considerados desvio de finalidade, impondo-se o recolhimento dos tributos suspensos acrescidos de juros e multa de mora, calculados com base na DI de migração do Repetro para o Repetro-Sped.

Cabe enfatizar que esses bens já estavam aplicados a atividade de E&P, sob o amparo do regime Repetro, por uma prazo, por vezes, muito maior que os 5 anos exigidos pela nova legislação.

Existe uma aparente dificuldade de adequação da legislação à atividade, devido às suas características intrínsecas.

Na migração de regimes, do Repetro para Repetro-Sped, deve haver muita cautela, evitando-se assim uma série de penalidades legais, tais como a execução do termo de responsablidade (TR) com pagamento total dos tributos suspensos acrescidos de encargos moratorios, a aplicação de multa de 10% sobre o valor aduaneiro dos bens pelo descumprimento de prazos e condições do regime especial, e multa de 75% sobre os tributos devidos, em caso de autuação fiscal.

Além disso, toda atenção é pouca nos lançamentos contábeis, que se forem incorretos, trarão impactos na apuração contábil e no recolhimento de tributos incidentes sobre o resultado (IRPJ e CSLL).

Apesar das dificuldades de adaptação ao novo regime, percebe-se que houve uma grande evolução com a inclusão da modalidade de aplicação do regime na importação de bens para permanência definitiva no País, e nitidamente uma melhor compreensão e diálogo entre governo, as empresas e a Receita Federal, gerando benefícios mútuos e o estímulo necessário à atividade de exploração e produção de petróleo e gás no país. Nas suas atividades de descomissionamento, a Petrobras e as outras operadoras certamente devem buscar usufruir dos benefícios do novo regime, reduzindo assim os altos custos relacionados a essa atividade.

Sobre a autora: Julia Mota é sócia-fundadora do Mota Advogados, escritório de advocacia especializado no setor de petróleo e gás.

www.mlaw.com.br

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